O
projeto de leitura não é apenas mais uma metodologia para explanar o conteúdo
se o professor trabalhá-lo de forma a contemplar os pontos em que sua turma
precisa melhorar. Acompanhe:
Imagem: Freepik. |
Algumas
avaliações – nacionais e internacionais – constataram que um número
significativo de alunos brasileiros não compreende o que lê, não faz relações
entre as múltiplas informações que recebe, tem dificuldade em interpretar,
apropriar-se do conhecimento trazido pela leitura e fazer deduções. Em
consequência, tem dificuldade de posicionar-se criticamente frente ao que lê.
Proficiência em leitura: uma preocupação
nacional
“Das
mil coisas e conteúdos que a escola faz ou tenta fazer, o Pisa está nos
mostrando que ela se esquece da mais essencial: dar ao aluno o domínio da
linguagem. Se fosse necessário gerar um slogan para todas as escolas de todos
os níveis, esse seria: Só há uma prioridade na escola brasileira: ensinar a ler
e entender o que está escrito.”
MOURA
E CASTRO, Cláudio. A penosa evolução do ensino e seu encontro com o Pisa.
Parecer sobre a participação do Brasil no Pisa.
A
preocupação com a capacidade de leitura do povo está diretamente relacionada
com a certeza de que a qualidade de vida do cidadão na sociedade atual depende
do domínio dessa competência. Nessa perspectiva, a leitura é considerada uma
metacompetência necessária para a apropriação do conhecimento nas diversas
áreas do saber.
Por que um projeto de leitura?
O
objetivo de um projeto didático de leitura de um livro de literatura é o de
criar no leitor necessidades. São desafios que criam necessidades: querer
conhecer, apoderar-se de bens culturais ainda guardados pela escrita, descobrir
ouros mundos, perceber e buscar outras leituras que “conversem” com sua leitura
– a intertextualidade –, conversem com o leitor.
São
necessidades que podem gerar prazer, estimular repertórios – presentes ou
adormecidos -, fazer sonhar, ajudar a ler/ver o mundo.
E
não apenas para aqueles que almejam participar da produção cultural mais
sofisticada, dos requintes da ciência e da técnica, da filosofia e da arte
literária. A própria sociedade de consumo faz muitos de seus apelos através da
linguagem escrita e chega por vezes a transformar em consumo o ato de ler, os
rituais da leitura e o acesso a ela.
Assim,
no contexto de um projeto de educação democrática vem à frente a habilidade de
leitura, essencial para quem quer ou precisa ler jornais, assinar contratos de
trabalho, procurar emprego através de anúncios, solicitar documentos na
polícia, enfim, para todos aqueles que participam, mesmo que à revelia, dos
circuitos da sociedade moderna, que fez da escrita seu código oficial.
Mas
a leitura literária também é fundamental. É à literatura, como linguagem e como
instituição, que se confiam os diferentes imaginários, as diferentes
sensibilidades, valores e comportamentos através dos quais uma sociedade
expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos, suas utopias.
Por
isso a literatura é importante no currículo escolar: o cidadão, para exercer
plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literária,
alfabetizar-se nela, tornar-se seu usuário competente, mesmo que nunca vá
escrever um livro: mas porque precisa ler muitos.
(LAJOLO,
Marisa. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. 4ª ed. São Paulo: Ática,
1999. p. 105-6).
Para que um projeto de leitura de textos
de caráter argumentativo com textos literários?
1. Estimular a sensibilidade do leitor
“Até
uma certa idade, a literatura prepara-nos para a vida. Ela canaliza o movimento
entre o real e o imaginário. Alerta nossos tropismos afetivos. No final da
infância, ela nos dota de uma alma... Ela propõe moldes sobre os quais se
vestirão nossas tendências individuais, e esse vestir, sejam roupas sob medida
sejam de confecção, dará forma à nossa personalidade.
Ela
nos oferece antenas para entrar no mundo. Não quero dizer que ela nos adapta a
este mundo: ao contrário, seus fermentos de rejeição e de inadaptação e seu
caráter profundamente adolescente contradizem este mundo. Mas contradizem-no
dando-nos acesso a ele. Pelo romance e pelo livro, cheguei ao mundo.”
MORIN,
Edgar. Meus demônios. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. p. 20.
A
literatura, como arte que estimula o diálogo do leitor com a vida pelo
imaginário, oferece ao jovem a possibilidade de romper com a repetição e a
padronização das atividades do cotidiano, que tanto o exasperam, para dar vazão
às emoções que sempre cercam o enfrentamento do inusitado.
A
vivência do inusitado estimulará ainda o exercício da criatividade, da
curiosidade e da afetividade, tão importante para quem se prepara para o
futuro, para a convivência com o incerto, com o imprevisível e com o diferente.
A inserção
de um projeto de leitura literária na dimensão da rotina escolar pode trazer
para as atividades e para o espaço da sala de aula, tantas vezes considerados
tediosos e austeros, o caráter lúdico e de interatividade tão desejado pelo
jovem.
A
possibilidade de estimular a leitura entre os alunos, apresentando o texto
literário como um desafio que pressupõe um exercício produtivo e prazeroso –
porque criativo e criador –, é o motivo maior de um projeto de leitura que tem
na arte literária a sua estrutura.
2. Contribuir para a formação do leitor
competente e autônomo
“Caso
pretenda desenvolver a capacidade de formar opiniões críticas e chegar a
avaliações pessoais, o ser humano precisará continuar a ler por iniciativa
própria.
Como
ler (se o faz de maneira proficiente ou não) e o que ler não dependerá,
inteiramente, da vontade do leitor, mas o porquê da leitura deve ser a
satisfação de interesses pessoais. (...) Uma das funções da leitura é nos
preparar para uma transformação, e a transformação final tem caráter
universal.”
BLOOM,
Harold. Como e por que ler. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. p. 17.
Para
a formação do leitor competente e autônomo é necessário:
a.
Exercitar habilidades de leitura para desenvolver competências comunicativas
essenciais ao exercício da cidadania na sociedade da informação;
b.
Favorecer a apropriação da leitura do texto literário como momento prazeroso de
entretenimento que pode envolver a interação com outras linguagens;
c.
Favorecermos a criação de um ambiente real de letramento por meio da interação
entre leitores e leituras;
d.
Estimular a criticidade pela dialogicidade entre leitor e texto.
Segundo
a classificação de Dolz e Schneuly, 1996 (ROJO, Roxane, org., A prática da
linguagem em sala de aula, 2000, p. 170-1), os gêneros da ordem do argumentar
são aqueles:
“Cujo
domínio de comunicação social é o da discussão de assuntos sociais controversos,
visando um entendimento e um posicionamento perante eles. Seriam exemplos de
gêneros: textos de opinião, diálogo argumentativo, carta do leitor, carta de
reclamação, carta de solicitação, debate regrado, editorial, requerimento,
ensaio, resenhas críticas, artigo assinado, etc. Esses gêneros envolvem as
capacidades de sustentar, refutar e negociar posições.”
Na
antologia que dá suporte a esse projeto, a inserção de três narrativas de
ficção que dialogam entre si pelo tema tem como objetivo sensibilizar o aluno
para a reflexão necessária diante da tomada de posição.
A
construção de argumentos para defender um ponto de vista ou para convencer
alguém pode ser estimulada pela leitura, pela pesquisa, pela interação com o
outro.
Quando
essas atividades são centradas em um texto de Machado de Assis, por exemplo,
sabe-se que resultarão em reflexão sobre a condição humana e criação em linguagens.
O trabalho com textos argumentativos visa também levar os alunos a apreciar
bons textos literários.
Extraído
de:
- Veja também:
Modelo de projeto de leitura com representação teatral
Afinal, o que é ler um texto com proficiência?
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