Se
você não fala nheengatu, vai ter muita dificuldade de morar em São Paulo,
transitar ou mesmo conversar. Como assim? Acompanhe:
Imagem: Freepik. |
Vá
que você coma algo que lhe faça mal às pacueras ou que tenha um parente
muquirana que lhe negue uns trocados quando precise.
O
que você fará quando alguém lhe disser que está com dor nos oio, coceira na
oreia, brigado com a muié, palavras portuguesas com pronúncia nheengatu?
Na
metrópole, há 34 estações com nome nheengatu, sem contar os nomes de ruas e os
nomes de pessoas, como Iara ou Maíra.
Quem
não fala nheengatu nem pode tomar os trens, usar o metrô ou utilizar os ônibus
da cidade. Como vai dizer aqueles nomes, escritos nessa língua, para comprar um
bilhete ou pedir informação?
Não
poderá transitar pela Rua da Tabatinguera, a mais antiga de São Paulo, de
quando a gente de Piratininga fazia fuxico em nheengatu e ia para a beira do
Rio Tamanduateí buscar tabatinga para caiar as casas.
Não
poderá cruzar a ponte para ir à Mooca, não por medo dos tamanduás. Não poderá
nem mesmo passear pelo Vale do Anhangabaú, sob o qual passa o ribeirão em que
outrora Anhangá assombrava os índios com seus malefícios e sua água envenenada
que, mais tarde se descobriu, tinha arsênio. Vade reto!
Estações do metrô de São Paulo. Fonte: imagens públicas do Google. |
E
como morar na Vila Prudente e estudar na Cidade Universitária, tendo que cruzar
a Mooca, o Anhangabaú e o Butantã? Só falando nheengatu. E menos ainda passar o
domingo com a família no Ibirapuera.
A
Mooca em que, no século XVII, o opulento Manuel João Branco criava gado, que
administrava o ouro do Jaraguá, em nheengatu, e o gastava em português.
O
mesmo Manuel João que circulava em Lisboa carregado numa rede paulista por
índios levados de São Paulo, aos quais dava ordens em nheengatu, quando para lá
foi levar um pequeno cacho de bananas de ouro para presentear e bajular o rei
de Portugal, D. João VI, o Afortunado.
Se
viajar de trem e não conseguir relaxar a língua para dizer os nomes nheengatu,
não chegará ao Ipiranga, Tamanduateí, Utinga, Capuava, Guapituba, Paranapiacaba
ou, no lado oposto, Piqueri, Pirituba, Jaraguá, Caieiras, Jundiaí.
Nem
sei como D. Pedro foi proclamar a Independência verde e amarela no rio vermelho
do Ipiranga, se não falava nheengatu. Ou falava e não sabia?
E
coitado de quem tiver de ir a Carapicuíba, Itapecerica ou Embu. Cuidado, é só
pedra e cobra! Se for a Mogi das Cruzes por Itaquaquecetuba, Itaquera e
Guaianases, dá no mesmo, pedra e cobra. A cobra de Mogi o esperará nas Cruzes.
Mas
se você consegue falar esses nomes todos e não se perde, saiba que apesar da
proibição da língua nheengatu pelo rei de Portugal em 1727, você é bilíngue:
pensa em português, língua estrangeira, e fala em nheengatu, a língua
brasileira.
Pena
que na escola não nos digam isso. O fantasma do rei de Portugal ainda manda em
nossa educação.
Fonte:
MARTINS,
José de Souza. Você fala nheengatu? O Estado de S. Paulo, 9 abr. 2012. p. C6.
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1 Comentários
Nossa muito interessante!adorei!!
ResponderExcluirMinha professora de história citou essa língua e eu pesquisei e acabei encontrando esse ótimo arquivo... Parabéns!!!